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Bom, noite a todos, e bem-vindos. Estou fazendo esta gravação hoje, quarta-feira, porque no sábado dia da aula eu tenho esta conferência que o vídeo, conferência que me senti transmitida para Nova Iorque, onde estaram lá o Jeffrey Nyquist e o Jair Bolsonaro. Eu não tenho muita certeza dos horários, então para evitar qualquer problema, já estou gravando a nossa aula antecipadamente. Se houver a ocasião de eu dar a aula, se houver tempo de eu dar a aula, é normal, essa gravação fica para o outro dia, se não ela será transmitida no sábado, evidentemente, sem a sessão de perguntas e respostas, depois ficará então para outra semana. O problema que eu gostaria de examinar com vocês hoje aqui, é a questão da arte que tem suscitado inúmeras polêmicas nos últimos dias. Você tem uma parte dos formadores de opinião, as pessoas opinanças, classes falantes, falando em favor da total liberdade de expressão, de qualquer coisa que se denomine como arte. E por outro lado, você tem pessoas escandalizadas com certos conteúdos e geralmente reclamando não só da imoralidade das imagens, mas também da sua feiura, do seu caráter de esforo. E evidentemente, aparecem pessoas dando palpites sobre estética. E como acontece com todas as discussões públicas no Brasil nos últimos 20 anos, o foco dessas discussões é completamente errado e não tem nada a ver com seu objeto, expressa apenas sentimento de subjetivos das pessoas envolvidas e não chega a aprender o objeto que está realmente em discussão. Eu, como entrar nessas aulas aqui e praticamente tudo que eu escrevo, eu sempre digo assim, o objeto é soberano. No uma aula, não interessa a professora, interessa os alunos, o objeto tem que ficar visível na frente de todos e ele é que tem que nos dizer, aqui veio. Então, o total respeito pela consistência, objetiva do assunto, deve ser o critério número 1 de todas as discussões e de todos os estudos. No caso da arte, por exemplo, é quase inevitável que surja no decorrer das discussões a expressão o belo, ou a beleza. É certo? Como se isso fosse realmente a essência da arte. E o ponto se é isso, aparece multidões de pessoas dizendo que a função da arte é romper padrões. Eu digo, olha, eu vou explicar uma coisa para vocês. Nem o belo tem algo a ver com a arte, nem romper padrões tem nada a ver com ela. Isso são opiniões de pessoas que nunca estudaram o assunto e que não têm ideia da longa tradição de investigações filosóficas feitas a respeito desde Platão até o Rogers Court. Se bem que o Rogers Court é um defensor fervoroso, o conceito da beleza. Mas muito bem, se procuramos as primeiras especulações sobre a natureza da arte, nós as encontramos evidentemente em Platão e Aristóteles. Como Platão e Aristóteles são? As linhas mestres do pensamento e como diz o Arthur Lobdray, toda a história da filosofia mundial não passa de uma coleção de notas de roda-apé aquilo que Platão e Aristóteles disseram, é evidente que nós temos que começar a ouvir-los. Platão não tinha uma grande apreciação pela arte em geral, nem pela poesia em particular, porque ele acreditava que os valores supremos, que era o bom, o belo e o verdadeiro, só existem numa dimensão supraterrânea, na dimensão da eternidade. Tudo aquilo que está sujeito à mudança, à corrupção e à extinção, evidentemente não pode ser o portador desses três valores, embora possa representá-los indiretamente de algum modo. Algumas pessoas interpretam isso no sentido de que Platão deseja uma arte idealista, mas isso é errado, porque para Platão o mundo das formas eternas, ou ideias, como as pessoas chamam, ou mais certas formas, não se constituem de ideias, não são pensamentos, mas são coisas perfeitamente objetivas que têm inclusive uma consistência ontológica, própria, muito superior a das coisas do universo espaço-temporal, o ambiente, o universo da geração e da cultura. A Aristóteles, por sua vez, criou um monte de confusões ao definir arte como mimesis, quer dizer, imitação ou cópia. Isso não foi por culpa dele, evidentemente, surgir essas confusões, mas, em geral, ele era um artista, quer dizer, arte e seria a cópia da natureza. Pessoas que estudaram muito superficialmente Aristóteles podem ter essa impressão, mas quando você aprofunde um pouquinho mais, você verá que, segundo Aristóteles, a obra da inteligência humana nunca age diretamente sobre as impressões dos sentidos, isso na memória, o que ele chamava fantasia. Para Aristóteles, o que nós chamamos de memória, o que chamamos de imaginação, é mais ou menos a mesma coisa, só que a memória obedece a certas pautas impostas, vamos dizer, pelo objeto exterior, o que nós chamamos de imaginação, se move um pouco mais livremente, porém, partindo dos objetos dos sentidos. O próprio Aristóteles dá um exemplo, se você concebe, por exemplo, uma montanha de ouro, você está sintetizando duas impressões dos sentidos, você viu uma montanha, você viu o ovo, então você combina de algum modo. Na verdade, a própria impressão de imaginação criadora é errada, é o exagero e pervo, a humana não cria nada, ela apenas combina novas formas algo que ela recebeu do mundo dos sentidos. Sem os sentidos nada aconteceria, se nós não recebéssemos esse material dos nossos sentidos não teríamos sobre o que pensar, não teríamos também o que imaginar. Então, como Aristóteles deixa muito claro que as operações da nossa mente não se dão diretamente em cima dos sentidos, mas do material acumulado e já previamente organizado na memória, ou fantasia ou imaginação, então você entende que a matéria prima de toda a arte, a matéria prima da mim, mas não são os objetos da natureza, mas os objetos como estão na nossa memória. Na verdade, se você pensamento, você vai desenhar por exemplo um elefante, você vai ter que olhar várias vezes o elefante e entre o momento que você olha e o traço que você faz no papel para reproduzir ele, transcorreu algum tempo, e se a imagem do elefante não tivesse conservado na sua memória, nesse breve instante você não conseguiria desenhar nada. No caso do desenho feito da cópia da natureza, por assim dizer, você ainda não está copiando o objeto tal e qual, mas o objeto tal como ele se concebe na sua memória. A memória evidentemente não é só uma função de registro e acumulação, mas é a função de organização. Você tem a função ativa da memória, é uma coisa que já era reconhecida no tempo de instante, que é uma coisa que cada vez se torna mais evidente, ou seja, de algum modo nós transformamos esse material sobretudo no sentido de sintetizado. A simples operação de abstração que nós fazemos, como por exemplo de vários objetos similares que você viu, você abstrai ou extrai deles, a forma da espécie, ou seja, você viu vários gatos, estamos a ter ideia geral do gato, é claro que ao pensar a espécie gato você não está se lembrando de todos os gatos que você viu, mas você tem uma espécie de gato esquemático, gato resumo, que para você representa todos os gatos. Então, essa é uma coisa que só pode acontecer na memória, onde um objeto único pode ser muito, né, isso, da onde nós podemos, então, nos reportar de novo a Platãs, porque este gato que representa todos os gatos, esta vaca que representa todas as gatos, as vacas seria, vamos dizer, uma imagem, uma cópia remota da ideia ou forma eterna da espécie. Na outra vez, não é a mesma coisa, quando fala a forma da espécie, não é a forma que você tem na sua mente, a sua mente, quer dizer, cria, por assim dizer, uma imagem remota que simboliza a ideia eterna que são os modelos das espécies, modelos das espécies. Então, são como as ideias que Deus tem a respeito, quer dizer, quando ele cria uma espécie, ele tem na sua mente um modelo que já contém implicitamente todos os exemplares dessa espécie e todas as suas variações internas, todas as suas cores, formatos, variedades, sub-raças, etc. É claro que isso não nos é acessível, quer dizer, esta espécie de imagem arquetípica da espécie inteira, nós não temos acesso a isso, nós podemos criar um símbolo dela, uma representação remota. Então, no fundo, Platão e Aristótão estão dizendo a mesma coisa, não estava vendo aqui uma tomada de posição idealista ou materialista ou realista, de fato, não é isso. Ora, quando a Aristóteles diz então que a arte é mímises, ela é imitação de um conteúdo da memória ou imaginação que, por sua vez, remete de algum modo algum do sentido, ou pretensamente imitado com fidelidade e realismo, ou combinado em outras formas. Essas observações, elas jamais foram desmentidas, você não tem nenhuma teoria da arte que desmenta essas primeiras constatações de Platão e Aristóteles. Ao contrário, se nós pulamos, fazemos um salto de 2400 anos e vamos até o Benedetto Croci, já no século 20, Benedetto Croci definir arte como expressão de impressões, o que ele está dizendo? Exatamente a mesma coisa de Aristóteles, quer dizer, é uma imitação de impressões que se depositaram, se organizaram, se modelaram na memória ou imaginação e que em seguida são exteriorizadas ou expressas pelo artista. Essa primeira série de constatações pode ser resumida, então, na definição dada pelo Benedetto Croci, a arte é expressão de impressões. Uma segunda série de constatações também óbvia e inegáveis, é que a arte consiste em fazer alguma coisa, quer dizer, essa expressão não é meramente subjetiva, você simplesmente pensar em algo ou você se recordar das formas que você absorveu, isso ainda não é arte de maneira alguma, é só ter sentido falar em arte, não, é que você faz algo com ela, você faz um desenho, faz uma estátua, compõe uma música, escreve um poema, a arte tem que ter um objeto, está certo? Esse objeto pode se constituir de uma ação humana, como por exemplo na dança, está certo? Ou na própria música, ou numa representação teatral, mas de qualquer modo é uma este sempre e sempre e sempre é uma exteriorização ou expressão. Então, até este ponto, tudo que eu estou falando é suficientemente óbvio para não ter nem a possibilidade de questionar, vamos dizer, a obra pretensa obra de arte que nasceu e morreu na cabeça do seu inventor sem que ninguém mais subesse, ela evidentemente não tem porque entrar nas nossas considerações e sobre esse ponto de vista eu seria até o William Shakespeare, tudo que eu inventei na minha cabeça, eu posso, me acharam o William Shakespeare porque eu concebi um teatro e me até as pésbara não escrevi nada, então isso aí não vale. Então, a arte é expressão de conteúdos de memória ou de imaginação, porque eu recordando de novo que para a instituição é a mesma coisa. Em segundo lugar, a arte é um fazer, é alguma criar algo, este algo pode ser um objeto material, e não pode me negar para colocar uma música, um objeto material, então a música é um objeto que alcança os seus sentidos, ou ela pode ser uma série de gestos e atitudes humanas, e estes objetos podem por sovês ter uma durabilidade grande, é certo como por exemplo no caso de um estado ou de um edifício, e pode ter uma existência fugar, como por exemplo uma representação teatral única, ou uma execução única de uma música, e eu lembro aqui por exemplo que o grande maestro Céu de Lividac não gostava de gravar as suas performances, porque ele achava que a execução da música é uma coisa que acontece num momento, num lugar e só vale ali, quer dizer a reprodução já estraga tudo, segundo ele, então quer dizer a obra de Ardor pode ser fugais, mas em todos esses casos ela é uma exteriorização, ela é uma espécie, então a definição do Benedetto Corte continua absolutamente indiscutível, se você entender que com impressões ele não está se referindo só ao material bruto colhido pelo cinco sentidos, mas aquilo que se depositou e se estabilizou como formas na memória, fantasia ou imaginação. Em absolutamente todos esses casos, todos esses casos, se você entender que o objeto da obra de Ardor representa, não é a mesma coisa representada, um desenho de um elefante não é um elefante, então podemos dizer você desenha um elefante, então você entrou no campo de Ardor, mas se você tipo, mostra um elefante, você não está fazendo Ardor nenhum, ou se você aponta um elefante, então esta distinção entre o material da obra e a obra esta também é essencial, ou seja, só existe a obra de Ardor, a partir do instante em que o material bruto, seja ele vindo do mundo exterior, seja vindo dos nossos sentimentos, das nossas marinações, encontrou uma forma, sem a forma não dá para expressar, a expressão informe ou expressão sem forma, é pior que o quadrado redondo, se a coisa não tem forma não tem como expressá-la, então essa diferença entre a obra de Ardor e o seu material bruto, este é o outro elemento essencial, constante e universal em todas as obras de Ardor. Ora, esta forma, ela não vem só do próprio objeto, ela é um produto da ação da inteligência humana, quer dizer você teve que, para você estar olhando o elefante, eu digo que você vai olhar tudo do elefante, não, você vai olhar certos aspectos, quer dizer você fez uma abstração, por exemplo você não está representando o estômago, o coração, os intestinos do elefante, vai dar sua forma externa, se você decidir representar os intestinos ou estômago, você vai ter que abrir a barreira do elefante e daí o rosto material que vai estar presente na sua frente é bem diferente de um elefante vivo. Então, a primeira operação que nós temos é a operação de abstração, quer dizer nós separamos certos aspectos que nos interessam, o que nos chamaram a atenção, ou que você julga ser a mais importante do objeto, a sua forma essencial, ou coisa assim. Então, isso eu estou dizendo para enfatizar mais ainda a distância, a separação entre a obra de arte e o seu material bruto. Isso significa que nenhuma apresentação de material bruto é arte jamais. Isso, eu vou dizer, é uma espécie de contradição. A apresentação do material bruto não teve nenhum trabalho interior do ser humano, mas quando eu mostro um elefante, eu não faço o elefante. A obra de arte não é minha, o que eu quero é que o simplesmente aponte no mundo exterior, ou que eu expresse, a expressão direta de um sentimento, de um desejo, de uma emoção, não é obra de arte. Eu construí a mártela no dia de grita, aí ele não está fazendo uma obra de arte em torno da dor que ele sofre, ele está simplesmente apressando a dor diretamente. Então, isso aqui é absolutamente fundamental. Se, por exemplo, eu vejo uma pessoa, uma mulher bonita e sinto uma atração sexual por ela, ela fala, não tem arte nenhuma, e agora eu posso representar isso aí. Eu faço um desenho, faço um poema, eu faço um crio, produzo qualquer coisa que represente. Então, essa ideia da representação é inerente à arte. Ela nunca é uma apresentação direta de alguma coisa, é uma representação. Se não fosse assim, nós consideraríamos que todo o universo existente é uma obra de arte feita por nós, o que é evidentemente um absurdo. Então, a obra de arte é algo que nós fazemos, nós fazemos. De acordo com o trabalho da nossa imaginação, da nossa inteligência, da nossa capacidade de abstração e da técnica artística adquirida pelo ensino e treinamento. Então, onde é que entra o tal do belo nisso aí? Bom, eu acho que entre todos os grandes filósofos, houve sempre o conceito de que o bom e o belo e o verdadeiro, como chamava John Don Scott, são os transcendentais. Eles, por definição, só podem existir no plano da eternidade. Por exemplo, se você supuser uma verdade, bom, pode haver uma verdade provisória, uma coisa que é verdade enquanto está acontecendo, por exemplo, aí eu estou com dor de barriga. Isto é uma verdade eterna, eu falo, não, isso é uma verdade passageira, a coisa do dor de barriga passar. Se eu continuar dizendo que estou com dor de barriga, eu estou mentindo. Então, a verdade é que o regor só existe no plano da eternidade, no plano de parênteses. Quando eu digo isso, deve-se levar em contas observações que eu fiz no filme Jernias da Pessoa, que estão registradas no filme, sobre a eternidade daquilo que é fugaz. Mas isso não desmente o que eu estou dizendo sobre a eternidade. Então, o bom e o belo e o verdadeiro são os transcendentais de que fala John Don Scott. Isso quer dizer que eles não são observáveis e parte alguma do mundo da experiência. Então, você só pode representá-los indiretamente. Então, o belo é pintável, não é pintável. A verdade é desível. Não, você pode dizer algo que significa o que remete a uma verdade, mas não é a própria verdade que você está dizendo. Quando Jesus Cristo diz, eu sou o caminho à verdade da vida, ele está dizendo que ele pessoalmente é a verdade. Ora, quando você diz o nome Jesus Cristo, ou quando você está dizendo algo a respeito de Jesus Cristo, você está dizendo a verdade, não, você está representando indiretamente a verdade. Ela pode estar mais presente ou menos presente, mas em nenhuma expressão humana dela, ela estará presente na sua plenitude. Isso também vale para o bem. Nós sabendo, por exemplo, que o ser humano é um ser humano que se esforça a vida de Deus para fazer o bem, mas esse bem sempre continuará limitado e relativo. Quer dizer, um bem total, indiscutível, absoluto e incontestável, isso aí só mesmo é o próprio Deus. Então, nesse sentido, é que a arte tem, na verdade, pouco a ver com o bom, o belo e o verdadeiro. Ela apenas remete a ele, mas ela remete a ele como ele remete em qualquer outra coisa. O desenho de um elefante está tão próximo do elefante quanto as nossas representações da beleza estão distantes da beleza divina. Você nunca vai desenhando, produzindo um elefante. Então, uma vez a pessoa diz assim, olha, alguém diz assim, um soneto de John Keats vale mais do que qualquer ser vivo. Então, eu respondi assim, então faça um gato, um sapo. As coisas não são bem assim, você vê que o soneto de John Keats remete a uma dimensão de beleza suprima, mas não é essa dimensão. Então, aí nós temos a diferença entre um outro, o que é signo, o que é símbolo. O signo é algo que representa suficientemente o seu objeto, não integralmente, mas suficientemente. Ou seja, você vê um desenho do elefante, você não reconhece perfeitamente o elefante. Quando você está falando de coisas de uma dimensão transcendental, eterna, absoluta, etc., etc., a representação nunca é adequada, nunca é suficiente. Você obtém essa referência, onde há o bom, o belo, o verdadeiro, etc., etc., por uma função que o Mario Fernando Schöhn chamava a tímese parabolica. Tímese vem de tímose, quer dizer, uma avaliação, um valor, quer dizer, um movimento em direção ao valor. E parabolica por quê? Porque este salto em direção ao bom, ao belo, ao verdadeiro, descreve uma curva parabolica. Ele se aproxima, mas não chega lá. Então... O que eu disse até aqui, você entende que qualquer coisa pode ser o objeto de uma obra de arte. E não precisa ser uma coisa bela, nem boa, nem verdadeira. Se você observar, por exemplo, os quadros do Ierônimos Bosch, ou a famosa estátua de Laocóonte sendo estrangulada por uma cobra, não vai dizer que a cena é bela, é uma coisa horrorosa. E aquelas quadros pintadas por goia, de fusilamentos, de violências, etc., o objeto não tem nada de belo. Do mesmo modo, se você observar as tragendas de Shakespeare, você vê que tem alguns reservos de pior condutas humanas possíveis. Elas a bíblia está cheia dela. Assassinato, incesto, estupro, traições, tem tudo isso. Está certo? Não entendo tudo isso, está ali representado. Isto, quer dizer, porque a feiura não pode ser alegada contra uma obra de arte. Jamais. O que pode ser alegado, e isto é uma coisa gravíssima, são duas. Primeiro, a falha na representação. Quer dizer, os feitos querem representar uma coisa, mas ele não consegue representar outra, completamente diferente. Ele, por exemplo, quer nos fazer chorar e nós acabamos rindo. Eu me lembro do filme do Tarkovsky, o Rosías de Óficia, que eu me falei que ele vai me matar, em que um sujeito estava incombido de salvar o mundo. E, uma hora ele sai correndo de disparadamente semi-pelado com um roupão, e no roupão atrás tem o desenho do Yin-Yang. Eu falei, pô, mas aquilo era segredo último do universo, e eu estava correndo com um roupão com a fórmula do universo, e eu, na platela, não podia parar de errer. O que ele representou estava tão distanto do que ele pretendia representar, o efeito ficava cômico, então a falha na representação é o primeiro defeito. Em segundo lugar, nós não podemos esquecer que mesmo a aspiração humana, a beleza, como ela é limitada, todos os elementos de beleza que nós podemos encontrar no mundo sensível ou no mundo das nossas palavras, etc., é deficiente e tem, inerentemente, um elemento de feiura. Eu falei, ah, quero ver um tempo, o Manacolá, ver a Catedral de Chats, o Parthenon, etc., etc. Você está andando lá e daí tem um escorpião no chão. Ou as paredes estão sujas, ou apareceu um grafiteiro e escreveu algo contra a mãe dele. Esses elementos estão sempre presentes, então eles estragam, você quer ouvir uma música e aparece o vizinho pregando prego na parede, um cachorro latindo. Esta mescla, essa impureza da beleza artística é universal, nós não conseguimos escapar disso. Então, você vai num museu para ver obras de arte, você paga o ingresso, o preço do ingresso tem a ver com a beleza artística, tem nada a ver, em segundo lugar tem um porteiro, um farrador, um guia, tem um monte de turistas fazendo barulho, tudo isso que atrapalha. A contemplação da beleza artística é, na maior parte do caso, um tópica. Ela também é feita por tímidas e parabólicas. Quer dizer, eu me lembro, por exemplo, a primeira vez que eu ouvi uma opera inteira de Richard Wagner, na Vilfantá, eu fiquei absolutamente fascinado, mas eu estava ouvindo aqui na cidade de Bitinga, no domingo à noite, no meio do Maquermesse, com um radinho de pilha, você emmanou a barulheira em volta, e eu fazendo a abstração de toda essa barulheira para eu seguir a música em todos os seus passos, mais ou menos eu consegui, mas foi como se foi tímido e parabólica, uma audição idealizada, não real, não material. Toda a contemplação de beleza artística é assim. Em segundo lugar, é preciso levar em consideração que a mente humana funciona sempre por contraste, a mente humana é eminentemente dialética. Ela é cumprindo uma coisa por aquilo que a nega. Por exemplo, o pessoal, o dia, fala muito de prazer, eu digo, escuta, mas alguma vez que você tiver alguma experiência prazerosa, que não houve nenhum elemento desagradável ali misturado, isso é impossível, tá certo? Ah, levei a namorada para o motel, etc., etc., do quanto custou o motel. Começa por aí. Então, você vê que a chamada contemplação da arte, ela é também um processo de abstração, onde nós separamos algo que nós, a qual queremos prestar atenção, de algo que nós não queremos prestar atenção. Então, a famosa beleza, ela é utópica, você já tem acesso a ela por um esforço abstrativo, e só podemos conceber a beleza em si mesmo, na sua plenitude, se a tomarmos no plano da eternidade, ou seja, na outra vida, mesmo uma visão beatífica que o surjeitê durante a vida, ela não vai durar, sempre ela vai acabar. E ainda tem um outro detalhe, você vê que nas aparições de nossa senhora, antes dela mostrar alguma coisa do céu, até para as criancinhas, ela mora no inferno. Então, ela sabe que nós precisamos deste contraste, a beleza do mundo da eternidade, ela só aparece à noite por contraste com uma alternativa. Então, isso quer dizer que aquilo que nós consideramos feio, execrável, imoral, indecente, criminoso, etc., faz parte do mundo da arte tanto quanto a beleza. Esta feiura também é absoluta, não dá para ter uma figura absoluta, porque você olha lá, como apareceu a tua vida, um bebê com cara de porco, quer dizer, é o resultado da fusão, ou um porco macho com a minha mulher, ou vice-versa, ou homem gravido à porca, então aquilo é horroroso, evidentemente, mas é uma feiura total para não, primeiro lugar, porque você não precisa ficar contemplando aquilo o resto da sua vida. Você olha dois minutos, olha que bela porcaria, vê que ela escorte e vai embora. Então, tanto a dimensão do belo quanto a dimensão do feio, não são em si mesmo os objetos da nossa experiência. Nós temos a experiência indireta e sempre representativa. Muito bem. Se você entender tudo, até aqui, você entende que a feiura não é um objeto, não é uma objeção contra a obra de arte, principalmente porque existe, na obra de arte, o lado paradoxal, onde você observa, por exemplo, nos sonetos de Baudelaire, o chá do Baudelaire, onde pegava temas horríveis e os espunha numa linguagem, de uma beleza quase perfeita. Então você tem um contraste, você vê que a feiura e a beleza estão ali mesclados de uma maneira inseparável, como elas estão no mundo. Se você perguntar, Deus e o céu fez inferno. E ele diz, você tomara aqui uma firma, taxativamente, que no céu os eleitos contemplaram com satisfação o sofrimento dos maus no inferno. Então, mesmo no céu, você não está livre de ver o feio, de ver a maldade, etc., etc., etc., só que você a vê desde um ponto de vista onde você está totalmente livre dela. Você também observará que Dante, quando ele descreve as suas aventuras no inferno, ele atravessa o inferno como observador, ele está vendo coisas medonhas, mas ele não está apadecendo as coisas medonhas, ele está vendo como se fosse na televisão. O Virgílio Leva mostra aquelas coisas. Então ele tem ali um sofrimento, mas é um sofrimento intelectual, não carnal. Se ele estivesse passando o sofrimento carnal, não haveria o quê? Representação. Ele seria simplesmente mais um condenado do inferno como outro. Eu duvido muito o cara condenado do inferno, sei lá, queimado, espetada, etc., etc., ter a tempo de escrever a Divina Comédia. Tem a energia para escrever a Divina Comédia. Então, todos estes pontos nos indicam que tudo o rugamento de uma obra de arte deve começar com a seguinte pergunta. É uma obra de arte ou não? Se não existisse esse ou não, qualquer coisa seria uma obra de arte, inclusive as coisas que nós não fizemos. Tudo aquilo que está no universo, os planetas, as galáxias, as montanhas, etc., seria uma obra de arte que podiam ser... nós colocamos aquilo numa exposição e até vendemos. Eu vendo o cosmos como minha obra de arte. É absurdo, não há como continuar por essa linha de raciocínio. A obra de arte é uma representação. Portanto, ela não é a presença direta do seu objeto. Está certo? Mais de algo que o representa. Em segundo lugar, ela é uma coisa que o ser humano fez. Não existe a obra de arte espontânea que passe pelo artista e saia do outro lado sem a intervenção dele. A obra de arte que se autoproduziu sem um artista, ela seria um fato da ordem material. Ela seria o material da obra de arte, não a obra de arte. O outro dia apareceu em um deputado com um projeto de que o que quer que fosse transmitido por obra de arte seria inimputável. Criminalmente. Muito bem, muito bonito. Só que se você pergunta para esse deputado o que é obra de arte, o que não é, ele não sabe. Então, essa lei significa o seguinte. Qualquer coisa que qualquer cidadão fizesse, desde que ele alegasse que a arte seria inimputável. Então eu pego o estrangulo do meu vizinho e digo, obra de arte. Está certo? O que é que o estrangular do meu vizinho não é obra de arte? Porque não é uma representação do estrangulo, mas o próprio estrangulo. Então, a representação do crime, da maldade, do diabolismo, etc. Tudo isso é representação, não pode ser o próprio. O próprio ato, ou a própria coisa. Está certo? E nos últimos anos, nós vamos ter esse pessoal, o pessoal que alega contra a arte, a sua feiure, argumento em nome do belo, está completamente fora. Você vê que o culto do belo começa no ocidente, a partir da hora que vai se perdendo a noção dos transcendentais dos Jornal das Escolas. Está certo? Então, isso se reflete, por exemplo, na passagem, você vê isso muito claramente na arquitetura, na passagem do estilo bótico para o estilo clássico, chamado clássico, está certo? Se você comparar para uma catedral gótica com o Vaticano, existe um número do Piefo, que ele faz uma comparação belíssima sobre isso. Ele diz, as catedrais góticas, elas puxavam o ser humano para cima, quer dizer que o conteúdo delas não estava nelas, era algo que as transcendia. E demais, há demais, a catedral gótica era um livro, ela poderia ser lida, e você não terminava nunca de ler. Então, por assim dizer, a mensagem da revelação cristã inteira estava ali representada de algum modo no gótico. Ao passo que a arquitetura do Vaticano, por exemplo, é uma coisa horizontal que impera sobre a cidade de Roma. Então, já não se tratava de puxar o homem para além da terra, mas ao contrário, de instalar-lo na terra sob a administração de um poder terreno. Está certo? A partir desse momento, que se vai perdendo essa noção, onde é da referência aos transcendentais, é que começa o culto do belo na arte. Então, a obra de arte começa a ser coisa bela em si mesma. Também é a época do colecionismo. É porque as obras de arte começam a ser vendidas por altíssimo preço, isso tudo vem na renascença. Eu bando de gente que ficou rico na renascença, banqueiros, comerciantes, etc., e começaram a colecionar a obra de arte. Então, a obra de arte se torna um valor em si, independente daquilo que ela remete. E se torna, evidentemente, um valor comercial, um valor financeiro, um valor de mercado e um objeto de culto e de contemplação. Quer dizer, o feito compra um quadro, que ele fica olhando e fala que bonito, etc., etc. Ou aquilo que o quadro pode estar remetendo, não interessa mais. Então isso quer dizer, o culto do belo é uma perversão da arte. Foi a primeira perversão. Daí, considerações de mercado fazem com que certos estilos artísticos serão mais preferidos, serão mais do gosto de quem tem dinheiro para comprar. E outros não. E, daí, sobre o que se chama o académico. O que é o académico? São modos convencionais, de pintar, de desenhar, de compor, de escrever, que agradam a plateia rica, que se acostumou com essas formas, e não aceitam outras formas diferentes. A hora que a consolida esta perversão aparece, a perversão compensatória, que é o famoso romper os padrões. Daí, os pintores começam a pintar coisas que propositadamente rompe com o gosto dominante da plateia rica. Então isso quer dizer, o belo romper os padrões não tem nada propriamente a ver com a arte, mas tem a ver com uma circunstância social. Se você é um sujeito rico, que está bem divido, satisfeito com a sua situação, etc., você dera arte acadêmica para comprar. O arte acadêmico é o que estiver na moda, porque mais tarde a ruptura de padrões está bem ensurada na moda e começa a ser consumida exatamente como a outra. Mas, exatamente como a arte acadêmica. Hoje você não tem um ricaço que não tem várias quadras ali que rompe, padrões, etc. Então, o culto do belo e a ruptura de padrões tem a ver com fatores sociológicos, que são mutáveis e que em si mesmo não tem nada a ver com arte ou não-arte. Porém, esta ideia da ruptura dos padrões, ela se apostou tanto da cabeça de certos artistas que eles esqueceram do... Você pode romper todos os padrões, mas tem uma coisa que você não pode romper, você não pode romper com a definição de arte porque você não está fazendo outra coisa. E eu dou como exemplo, nesta exposição do Santander, aquelas ósseas com palavrões inscritas pelo António Obá. E isso não é uma representação. Isso tem uma ofensa direta. Ele não representou a ofensa, ele a praticou, portanto, não a representação e portanto não a arte nenhuma. Mesmo que ele fizesse isso bonito, ele está usando a técnica artística para cometer um ato que em si mesmo não tem nada de arte. Ou seja, você escreve palavras do Maldosta e talvez não seja a ofensa mais grave que você possa fazer o cristianismo. É certo? Eu acho que por exemplo, os falsificos anais são muito piores. Mas eles também não são artes, porque você não está representando isso, você está fazendo, você está cometendo ofensa naquele mesmo momento. Então, se não há representação, não há a elaboração abstrativa que é o fundamental na arte, gente. Ou seja, em vez de inteligência humana, através da representação, se sobrepor ao objeto e de certo modo dominá-lo cognitivamente, ao contrário, ele está se submetendo ao próprio Império do Objeto sobre o artista, mais ou menos como naquela pirada do Português que foi privatizado pelo Peixe. Esse é a mesmíssima coisa. Então, isso quer dizer que sem entrar na consideração, na idealização do belo, ou sem entrar em qualquer conversa moralística, existem critérios objetivos, ou seja, se uma coisa é arte ou não é. E quando começam a vender essas coisas, esses objetos ou atos diretos, como se fosse arte, isso é realmente charlatanismo. Simplesmente não houve a elaboração intelectiva da coisa. Isso é tão arte quanto eu xingar uma pessoa, que eu vou tomar não. Não tem arte nenhuma. Claro que eu posso usar esse mesmo palavrão dentro de um contexto artístico, mas aí o foco já não é o ato agressivo em si, mas sim a sua representação. Deu para entender isso aqui? Se entender, então você vai ver que 99% da discussão que está se fazendo a respeito dessas expulsões é completamente maluco, porque é como as duas demagogias opostas, que é a demagogia dos retos que está ofendido com algo entre a energia e o ser arte, e a demagogia dos retos que quer fazer qualquer coisa e chamar de arte. Isso já basta para mostrar o baixo nível de inteligência da população falante brasileira. Quando nós vemos que o QI médio subiu em quase todos os países e baixou no Brasil, é para você ficar assustado e é para entender que nós temos que parar isso. Parar isso é muito mais importante do que você eleger a polícia da República, dar o golpe militar, resolver os problemas de convoque do país, etc. A inteligência é o único instrumento que nós temos para resolver os nossos problemas, e não é dântese querer resolver os problemas para ficar inteligente depois. Deu para entender isso aqui? Então o loja é só não haverá algumas respostas. Talvez eu especulhe alguma coisa mais sobre esse tema nas próximas aulas, ou talvez nós paremos por aqui, mudemos de assunto na semana que vem. Muito obrigado a todos e até a semana que vem.